quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Para viver um grande amor


Para viver um grande amor é necessário antes de tudo estar apaixonado. A premissa parece redundante, inútil, banal, até mesmo pueril, e por conseguinte desnecessária, de tão lógica que é. Mas é imprescindível. Não se vive um grande amor sem paixão. Pode-se viver um médio, pequeno, micro-amor. O que – quem sabe (e provavelmente é, mesmo) – é até mais desejável, enquanto racional e tranqüilo. A placidez, nos grandes amores, só existe em breves momentos. Naqueles onde (e quando e como e por que), cansados de uma entrega integral e íntegra, os corpos se abandonam num abraço frouxo mas firme, os olhos se deixam navegar à deriva nos olhos do outro e vice-versa, jogo de espelhos sem começo, meio ou fim.

Para viver um grande amor deve-se ignorar solenemente o tempo. Deve-se recusar o passado e imaginar que o futuro não existe além daquele momento presente. Deve-se acreditar piamente que será eterno (mesmo com o chato do Vinicius de Moraes martelando na cabeça a terrível conclusão – “enquanto dure”). Sim, porque todo Grande Amor é Eterno. E durável. E duradouro. E infinito (mudança de versos: “que seja eterno, enquanto infinito”). Deve-se confiar – cegamente, como um fiel rejeita a ciência e abraça a fervura quente do milagre – que é possível parar o tempo, os ponteiros e todos os relógios do mundo. Que o mundo, a propósito, não existe além do refúgio criado pelos amantes, para viver seu Grande Amor.

Para viver um grande amor faz-se necessário a mudança para uma ilha deserta. Sem pegadas na areia além das suas. E nem é tão importante que esses passos se repitam na areia lado a lado – eles podem caminhar às vezes mais à frente, às vezes mais atrás, outras trilhando a mesma vereda, que nada mais é senão seus próprios passos. (“Olha! Aqui se confundem. Não se sabe mais qual a marca de quem. Se sobrepuseram. Tornaram-se um.”)

Mas, para viver um grande amor, mesmo numa ilha deserta, é importante saber que não existem ilhas desertas. Então, é imprescindível manter a força dos músculos para outras atividades que não apenas o ato mágico e único do amor. É imperioso dedicar-se à construção de fortes, de paliçadas, de fossos de proteção, de trincheiras, de casamatas. É necessário vestir couraças, armaduras, peitorais, coletes. Até para desvesti-los depois. Ainda que a nudez nos torne frágeis. Vulneráveis, somente um para o outro.

Para viver um grande amor é preciso reconhecer que só esse mesmo grande amor pode decretar seu fim. E, ainda assim, eterno, enquanto infinito.

*

“Vertigem”

Começou domingo passado e segue até dezembro a nova mostra de osgemeos (grafado assim mesmo), Gustavo e Otávio Pandolfo. Consagrados como grafiteiros, há muito romperam os limites dos muros urbanos e freqüentam o interior e o exterior dos melhores museus do mundo.

Em Sampa, claro, no Museu de Arte Brasileira da Faap.

Groove

Dentro do terreiro das programações “imperdíveis”, logo mais à noite, 20h, no TAM, o secular Teatro Alberto Maranhão, Serginho Groove faz jus ao apelido e reúne convidados, todos ilustres como o anfitrião. Chico César, Dorgival Dantas e Khrystal – entre outros – se apresentam ao lado do baixista e participam da gravação de novo DVD.

Lar

O Centro Acadêmico Amaro Cavalcanti, do curso de direito da UFRN, promove logo mais à noite debate sobre “Direito à Moradia” – na mesa, a arquiteta Dulce Bentes, o procurador-geral do estado Francisco Sales e o coordenador do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas, Wellington Felipe.

No NEPSA (Goiabinha), 19h.

Cadeiras

A si-la-bAs Cia. de dança é a única representante destas ribeyras no Festival Internacional de Dança do Recife e se apresenta, hoje, 17h, no Teatro Barreto Júnior. “Sente-se” é dirigido por Mauricio Motta, que divide o palco com Anízia Marques.

Dois em um

Contagem regressiva para dois próximos lançamentos literários. A proximidade em questão não se refere somente ao tempo: dia 5 de novembro, Alex Medeiros e Marize Castro dão à luz fluorescente do Midway suas últimas crias – o primeiro no foyer do Cinemark, com direito a pipoca e guaraná; a segunda, quase em frente, na livraria.

Dangerous

“Filmar é perigoso. Escrever é perigoso. Viver é perigoso. São demais os perigos desta vida – e não vêm somente de balas perdidas e governos demagógicos, os artistas demagógicos podem ser perigosíssimos!” – do professor-doutor (e ainda por cima uspiano) Marcos Silva, no Substantivo Plural, ontem.

Prosa

“Inteiramente esquecido da altura a que estava, procedera como se viver ali, perto do céu, fosse viver na terra, sem precisão dos braços cautelosos agarrados a nada.”

Miguel Torga

Bichos

Verso

“Confesso-me / de assim / ter sido // Ainda que não fosse mais”

José Bezerra Gomes

“Lápis”

Nenhum comentário:

Postar um comentário