quarta-feira, 1 de julho de 2009

Paixão


Dizem que a palavra mais bonita da língua portuguesa é saudade. Não, não é bem assim – em verdade: que saudade é palavra única na imensa Babel que sempre foi o mundo, depois da empreitada da Torre. Tá lá, no livro do Gênesis, apenas oito capítulos depois que o barbudo iracundo se aborreceu por uns frutinhos colhidos de uma árvore e achou por bem afastar a concorrência humana e expulsar o primeiro casal do Jardim do Éden.

Vale a pena ver os oito capítulos anteriores, que acontecem na velocidade de uma novela da Globo – dessas que a senadora Rosalba acha por bem elogiar: Caim mata Abel, Adão casa de novo, faz mais um filho, e daí pra frente é um tal de crescer e se multiplicar que faria corar o mais inibido dos coelhos. A moçada também vivia, então, uma vida longeva que era uma beleza (se engana quem pensa que o único recorde significativo é o de Matusalém, 969 anos: Noé chegou aos 950, isso, mesmo com aquela chuvarada toda – morasse ele no Passo da Pátria e eu queria ver). Mas a longevidade não era à toa, claro, afinal nem tinham inventado o tabagismo nem o fast food nem a prestação da casa própria muito menos o Senado Federal e seus segredos.

Bom, geração após geração e oito capítulos adiante, chegamos a Babel, onde o deus cruel do velho testamento volta a se trocar com seus filhos, desta feita preocupado com a possibilidade prática de eles adentrarem o céu sem a ajuda divina e a intervenção terrena dos franqueados instalados nos templos de adoração. O velho achou por bem confundir tudo e cada qual ter sua língua própria. A Torre de Babel ficou feito aquele hotel da Via Costeira, só o esqueleto. Daí pros portugueses foi um passo, e pros brasileiros um pulo atlântico mal sucedido.

Daí vem a saudade, palavra triste quando se perde um grande amor – e a definição, minha mesmo não é: é de “Primeiro amor” e nem desconfio quem seja o autor da letra e canção, mas que tem um eco de Paraguay, ah, isso tem.

E um grande amor o que é? Paixão, né? Então, por isso, vou ficando com essa como uma das minhas preferidas da língua portuguesa, e se réie pra lá a sua suposta falta de exclusividade internacional – em italiano, “passione”, em francês e inglês, “passion”, tudo farinha do mesmo embornal. O que não deixa de ser uma mão na roda para a nossa comunicação futura, capital mundial de 2014 que já somos. Quanto à Babel-Arena das Dunas, isso é outro papo.

*

PASSIONAL

A propósito, tem raízes passionais o enredo do livro que Cassiano Arruda Câmara lança hoje, 19h, no terceiro piso do Midway. Contrariando a máxima casa-de-ferreiro-espeto-de-pau, o lançamento contou com estratégias de publicidade: além de anúncios de jornal e comerciais na TV, foram espalhadas cartas fictícias entre os livros da Siciliano, convidando para hoje.

PASSION

“Paixão à la mode” é também o enredo da nova Mag!, nas bancas, assombrosos mas válidos R$ 18,90.

Uma penca de casais apaixonados desfila pelas páginas, entre outros Gertrude Stein-Alice B. Toklas, Serge Gainsbourg-Jane Birkin, Edith Piaf-Marcel Cerdan, Jean Cocteau-Raymond Radiguet (o primeiro e o último notoriamente gays).

MADAM

Escapando da paixão, a Mag! dedica ainda 12 páginas aos poemas visuais de Guillaume Apollinaire, o garçon do surrealismo, enquanto Eduardo Logullo explica “por que toda madame é determinada, personalista e apaixonada pelo que faz” através dos perfis e fotos de 17 madames famosas, entre elas a inconfundível Bovary.

CURA

No editorial, o alerta, que todo apaixonado desdenha: “A paixão é um vício que pode fazer mal. Quando é rejeitado, o apaixonado passa por sofrimentos fisiológicos. Os circuitos cerebrais relacionados à tomada de decisões arriscadas e os ligados à dor física tornam-se ativos. Hoje, a dor da paixão é levada a sério pela ciência.”

Desconfio que não são só os rejeitados que precisam de Dama Ciência, não. Enfim, a Fapern de Dona Isaura bem que podia investigar o caso.

Revistas

Falando em Fapern, a fundação lança duas revistas (Ciência Sempre e Perigo Iminente), um livro (Bom dia padre João Maria) e abre a exposição “Por quê a matemática”, tudo de uma tacada só: próximo dia 9, hora 18, no SEBRAE.

PROSA

“Vejam vocês, pois só se pode ver Natal com olhos de relâmpago.”

Carmem Vasconcelos

Perigo Iminente

VERSO

“Beijo-te – através dos cem / Anos que nos separam!”

Marina Tsvetáieva

“De nós nada...”

Nenhum comentário:

Postar um comentário