segunda-feira, 6 de julho de 2009

Duas histórias


Quase que ao mesmo tempo me chegam duas histórias, uma de vida, outra de morte. Uma no tom coloquial de um telefonema, a outra via email.

O poeta Diógenes da Cunha Lima – que andava tão sumido para mim quanto eu para ele – traz os sempre sorrisos na voz e conta a sua:

A filha recém-casada e o novo genro retornavam a Natal, vindos de Mossoró City. Noite alta, lá pelos lados de Lajes, uns três quilômetros antes, o carro recusa o caminho. Pifa, pane, pânico. Isso foi na quinta-feira passada. Noite, já disse, um breu dos diabos. Estrada deserta. Até que se aproxima um carro da polícia. Novo temor: e se fossem confundidos com bandidos? O carro parado no meio do nada e tal.

Esclarecidos os fatos, as circunstâncias, o motivo, dois dos quatro policiais se prontificam a levar o casal até Lajes, os outros permanecem tomando conta do carro – vai saber se aparece um bandido que além do crime é organizado em coisas de mecânica?

Pois. Os mesmos policiais arrumam um socorro em Lajes, o carro é reparado, consertado, enfim, pode-se seguir viagem. O rapaz, agradecido, oferece, a título de muito obrigado pela ajuda, duzentos contos aos homens da lei. Notem bem: quando entre um policial e o cidadão se coloca duas notas de R$ 100 quase sempre o preconceito associa o gesto a suborno, corrupção e jeitinho tipicamente brasileiro – mas aqui, não: aqui o lance era agradecimento puro e simples, alívio e reconhecimento.

Os policiais recusam – “De jeito nenhum. Não podemos receber.” Não sei se chegaram a complementar com um “estamos aqui para proteger e servir”, que nem os policiais gringos, mas o significado implícito é o mesmo.

Os quatro bravos soldados pertencem ao Comando de Operações Especiais e Permanente do Oeste. Estavam indo em diligência a Caraúbas. Pegar uns bandidos, trocar uns tiros. Não sei se foram, e, se foram, auguro que estejam bem. Mas naquela noite já fizeram seu papel: dar segurança ao cidadão. O poeta Diógenes, que já andou indagando em artigos “quem defende a polícia,” achou por bem registrar o fato, e eu também. Mas agora me pergunto se é tão inusitado assim essa história ou se estamos nos acostumando a viver assim, tristemente surpresos com policiais que estão, como eles mesmo disseram, apenas cumprindo o seu dever.

a onça e o bode

A outra história deixo que conte quem me contou: Márcia Guedes Fernandes, filha de Toinho Guedes. É a que segue, tributo a “seu” Rafael, quase tão anônimo quanto os policiais da história anterior, e tão verdadeiro e simples quanto:

TRIBUTO A “SEU” RAFAEL

“São 12h, do dia 2 de Julho de 2009. Encontro-me na cidade do Rio de Janeiro, para descansar um pouco e me refazer da irreparável perda de meu querido PAI, Antonio Guedes (‘Toinho Barbeiro’), que se foi quatro meses atrás. Sinto muito a falta de meu querido pai. Mas me restava um grande trunfo, que era ter, ainda, aquele que me acolheu e me adotou como filha de coração, logo depois da morte de papai. Grandes amigos inseparáveis, dos tempos de juventude, do Exército onde juraram amor a Pátria, do Bairro da Ribeira, do Grande Ponto, da Lagoa Seca, do Alecrim Clube, do namoro ao casamento (Sr. Manoel Rafael de Araújo com sua musa Raimunda, e meu papai com a musa dele, minha mãe, Socorro), dos nascimentos dos filhos, dos netos. Eu nasci e cresci vendo aquela amizade dos dois, que nada no mundo fazia interromper, até a partida de meu querido pai para o andar de cima. Mas hoje, poucos minutos atrás, meu irmão Marcus Guedes, me liga, para me dizer, assim mesmo: ‘Minha irmã, acabamos de perder o nosso pai de coração, perdemos a nossa Onça (era assim como chamávamos uns aos outros) que bravamente lutou nestes últimos dias de vida.’ E aí a tristeza voltou a me rondar, e aqui estou eu, no meu laptop, tentando prestar minha última homenagem, à minha querida Onça, que tanto me queria bem, me orientava, me apoiava, neste momento tão difícil pelo qual estamos passando... E agora? Como vou viver sem os dois? Só tenho uma certeza: que, agora, neste momento, os dois velhos amigos já estão juntos, para continuar a velha e inseparável amizade que foi interrompida há quatro meses aqui na terra. Mas também tenho certeza que, de lá de cima, teremos mais dois anjos da guarda a nos proteger, a nos guiar e a nos iluminar em nossas vidas. Que Deus, na sua infinita bondade, receba mais este grande Homem de Bem, que juntamente com meu pai voltarão a fazer uma dupla perfeita: a Onça e o Bode.” [MÁRCIA GUEDES FERNANDES]

*

PROSA

“Sou um cético e um homem de fé.”

Fausto Wolff

A imprensa livre de

VERSO

“Nem um dia se passa... nem um minuto ou segundo sem um parto; / Nem um dia se passa... nem um minuto ou segundo sem um morto.”

Walt Whitman

“Folhas de relva”

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