segunda-feira, 20 de julho de 2009

Adivinhe quem vem para o café-da-manhã: Paulo Araújo

[sábado 180709]

Continua hoje o “Pequeno dicionário angolano” que o jornalista curraisnovense Paulo Araújo preparou especialmente para esse espaço – o que invalidaria, em tese, o título desta coluna aos sábados, visto que, anunciada esta segunda parte uma semana atrás , nada resta hoje a adivinhar.

Resta, no entanto, passear pelas palavras que exprimem partes de Angola, de Luanda, um tico de fama, outro de samba, e se descobrir a bordo de uma candonga, sem saber aonde ir. Pois, pois, se desejarem, confiram outras palavras e histórias sobre esse rincão africano no blog www.casadeluanda.blogspot.com, diário virtual escrito por angolanos, brasileiros e portugueses – ou seja, tudo farinha do mesmo saco.

Pequeno dicionário angolano [II]

FAMA

Thais Araújo, Lázaro Ramos, Netinho de Paula, Alcione, Emílio Santiago, Alexandre Pires, Roberta Miranda, Ritchie, Ivete Sangalo, Roberto Carlos, todos são idolatrados em Angola. A filha de Djavan é dona do Bahia, um dos restaurantes mais famosos de Luanda. Na coluna “Gente” do jornal de Angola todo dia há duas ou três notas sobre cantores e atores brasileiros. Em novembro, a TV Globo promoveu um show da Banda Calypso no estádio dos Coqueiros em comemoração ao Dia da Amizade Brasil-Angola. O mundo veio abaixo.

FUTEBOL

Em 2010, o país vai sediar a Copa Africana das Nações, o Cocan. 10 estádios estão sendo erguidos pelo país para receber o certame. Os principais times de Luanda são o Petro e o 4 de Fevereiro, que se revezam nos estádios da Cidadela e dos Coqueiros.

HISTÓRIA

Os portugueses exploraram Angola até 1975, quando uma guerra de libertação nacional pôs fim ao colonialismo. Apoiado por Cuba, o país ficou sobre influência da então União Soviética. O Brasil foi o primeiro país do mundo a reconhecer a independência de Angola. Não houve uma transferência de poder planejada e mais de 800 mil portugueses abandonaram tudo o que construíram na ex-colônia, deixando o país sem a menor estrutura. Uma guerra civil massacrou o povo até 2002. Com a paz, a economia deu uma guinada rumo ao capitalismo única no continente africano.

LÍNGUA

Os brasileiros, depois de alguns dias, vivem um processo de mutismo por descobrirem como falam errado. Em Luanda, qualquer motorista ou segurança se expressa como um personagem de “Os Maias”, de Eça de Queiroz. A influência da novela brasileira começa a destruir conjugações bonitas como “gostava imenso de ofertar-vos essa rosa”.

MÚSICA

Três ritmos principais. O Semba, com “esse” mesmo, mais clássico, de bom gosto, recheado de histórias sobre o país e o amor. Paulo Flores é o grande nome. Há também o Kuduro, uma forma de expressão que a juventude da periferia encontrou para cantar e dançar sua triste realidade e o hip hop, delicioso de ouvir quando cantando em português com sotaque angolano. O Kuduro começa a se tornar popular no Brasil a partir de Salvador. Ano que vem deve ser a coqueluche do carnaval baiano.

ÓBITO

Um funeral é uma grande festa e geralmente dura uma semana. O morto fica numa geladeira e a família vem de todas as partes do país para comer, beber, ouvir música e festejar a morte, numa relação com o fim da vida completamente diferente da nossa. As crianças só ganham nomes próprios depois dos três, quatro anos, pois se morrerem – e a taxa de natalidade é absurda – os pais sofrem menos ao lembrar delas como “a mais pequena”, “o miúdo” etc. Toda semana tem óbito em alguma casa de Luanda.

POLÍTICA

José Eduardo dos Santos é o presidente desde 1979. Houve eleições para renovar uma câmara de deputados formada há 12 anos, em setembro do ano passado. O MPLA fez mais de 80% do parlamento. Para 2009, estavam programadas eleições presidenciais, mas aí veio a crise... São os publicitários brasileiros que fazem as campanhas políticas por lá. Lula é extremamente popular e amado em Angola. Em 2003, ele esteve no país com Gilberto Gil para perdoar a dívida, pedir perdão pela escravidão e chorar no Museu da Escravatura.

TRANSPORTE

Não há serviço de ônibus ou taxis como conhecemos no Brasil. Ou você tem um carro (muito baratos, importado de Dubai, e das melhores marcas do mundo) ou vai andar de “candonga”, um tipo de kombi chinesa de cor azul. As candongas andam superlotadas, em alta velocidade, com o som nas alturas e não tem escrito na frente para onde seguem.

ZUNGUEIRAS

As mulheres, com sua raça e disposição fora de série para o trabalho, são vendedoras ambulantes de tudo que se necessita em Luanda, carregando na cabeça bacias com pesos absurdos e fazendo girar a economia da África. São chamadas de zungueiras e vendem peixes, verduras, pães, panelas... E ainda têm disposição física para carregar um bebê amarrado às costas, um na barriga de grávida e puxar outro pela mão. [Paulo Araújo]

PROSA

“A memória é irregular. Ao contá-las em ordem, surgem novas lembranças que estiveram amplamente esquecidas.”

Bioy Casares

Histórias fantásticas

VERSO

“a vida se reinventa / a morte não”

Diva Cunha

“no meu corpo”

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