sábado, 24 de janeiro de 2009

Adivinhe quem vem para o café-da-manhã: Manoel Onofre Junior

Em 1979 o sobrescrito tinha 12 anos e os livros da editora Clima já rondavam as estantes da casa dos meus pais. À época um dos poucos que li e não esqueci foi “Breviário da Cidade do Natal”, de Manoel Onofre Junior, com capa e ilustrações internas com o traço inconfundível de Dorian Gray Caldas (inconfundível, também, a marca da editora, com o nome “Clima” sobre o mapa elefantóide deste Ryo Grande). Era um livrinho simpático, despretensioso, quase um pot-pourri de tudo o que de mais peculiar tem a nossa história. E findava com um “Guia sentimental da cidade”, escrito por Newton Navarro especialmente para o “Breviário”.
Infelizmente, nem o guia de Navarro nem as ilustrações de Dorian se repetem no “Guia da Cidade do Natal” (praticamente um “Breviário” em trajes novos ou renovados), que o Sebo Vermelho relança, hoje, entre as dez da manhã e o pingo do meio-dia na Poty Livros da Cidade Alta – a mesma Cidade Alta, aliás, que intitulava os versos de Newton Navarro: “Terno coração de pedra,/ mas,/ pedra de sentimento/, que de tanto amor/ em duro granito se tornou.”
O texto que segue é um dos que foi quase que completamente modificado em relação ao seu equivalente no “Breviário” – afinal, o original está completando três décadas neste Zero-Nove e, então, a cidade ainda não se assanhava tanto como hoje com construções verticais, que se contavam nos dedos: era a época da construção do Chácara e do Rio Mar, ambos na Deodoro (“dois mastodontes de concreto e vidro fumê”, nas palavras do autor, e que prenunciavam “a selva de pedra”, “o triste retrato na parede”).
(Embora, sim, outros aspectos não tenham mudado – em 79, Onofre escrevia: “Colunistas sociais costumam chamar Tirol e Petrópolis de ‘bairros elegantes’. Aí vive a fina flor da burguesia e, também, algumas pessoas que, simplesmente, querem morar bem. Bairros novos, sem caráter, esses.”)
Aproveitem, pois, o café-da-manhã com Manoel Onofre e sigam depois para a Poty:

DEVASTAÇÃO DO VERDE
Em visita a Natal, o escritor Mário de Andrade definiu a cidade com estas palavras:
“... é um encanto de cidadinha clara, moderna, cheia de ruas conhecidas encostadas na sombra de arvores formidáveis.”
Mário esteve aqui em 1928.
Hoje, decorridos 80 anos, a população multiplicou-se, as ruas encheram-se de veículos, espigões agridem a paisagem, mas a urbe ainda conserva um pouco daquela aparência bucólica.
É verdade que, das árvores formidáveis, restam apenas algumas na Rua Jundiaí e na Praça André de Albuquerque. Mas cajueiros, mangueiras e outras fruteiras resistem nos quintais, e quase sempre se cuida da arborização pública – acácias, jambeiros, etc.
Não há dúvidas: sob este aspecto, Natal é uma cidade privilegiada. E ainda tem o Parque das Dunas, a segunda maior floresta urbana do país.
Como bem dizia Mário de Andrade:
“É capital, se sente que é capital, o que firma bem a sensação de conforto praceano, tudo à mão, e ao mesmo tempo, tem ar de chacra, um descanso frutecente, bolido de ventos incansáveis.”
É isso aí.
Mas, não devemos ter ilusões quanto ao futuro, pois inexiste uma mentalidade coletiva de respeito ao meio ambiente.
Dia desses, em Ponta Negra, um ponto do Morro do Careca pegava fogo, mas somente duas ou três pessoas se incomodaram em tomar providências. As demais – dezenas, centenas – pareciam nem estar vendo aquilo. Negócio de apagar incêndio não era com elas. “Uns matos queimando, coisa sem importância...”
A mesma insensibilidade transparece no mau hábito, que o natalense tem, de jogar lixo e metralha em terrenos baldios.
Há anos, a Prefeitura mandou botar abaixo todos os pés de fícus da cidade. motivo: estavam empestados de lacerdinhas. Solução “genial”, em vez de se combater a praga de insetos.
A retirada de areia das dunas, para uso na construção civil, tem se constituído, também, numa ameaça – tão grande quanto a poluição do rio Potengi.
E que dizer de outra espécie de poluição – a predial, que asfixia a cidade?
Numerosos arranha-céus foram construídos, nos últimos anos, a maioria em Petrópolis, Tirol, Candelária e Ponta Negra. Esses mastodontes de concreto e vidro começam a proliferar em outros bairros da classe média. A paisagem vai ficando emparedada, e o clima cada vez mais quente. Inúmeros outros problemas decorrem desse crescimento vertical desenfreado, inclusive a contaminação do lençol freático. Ambientalistas e urbanistas sabem muito bem disso.
Infelizmente, tudo indica que aquela Natal, encanto de Mário de Andrade, dentro em breve será, como a Itabira de Drummond, apenas “um retrato na parede”. Doerá tanto como já doem estes versos de Ferreira Itajubá:
“Natal é um vale branco entre coqueiros:/ Logo que desce a luz das alvoradas,/ Vão barra afora as velas das jangadas,/ Crescem no rio as trovas dos barqueiros.” [Manoel Onofre Jr]



PROSA
“Manoel Onofre Jr., pesquisador munido de discreta tenacidade, é também exemplo que busquei seguir.”
Tarcísio Gurgel
Informação da literatura potiguar
VERSO
“Escrever para abrir o leque.
Eis minha meta.”
Marize Castro
“Escrever”

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