quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Incompatibilidade de gênios e de horários

Que Caetano Veloso e Tom Zé são gênios me parece indiscutível. Ao menos para o sobrescrito e metade da torcida do Flamengo, um terço da torcida do ABC, um décimo da do Força e Luz.
(O Força e Luz entrou só pra eu me mostrar como sou antigo.)
(O América não entrou só pra ver se algum torcedor reclama.)
Semana passada escreveu Veloso em seu blog (detalhe: a 1h21 da madrugada, horário, assim, digamos, meio joãogilbertiano) sobre o último CD de Tom Zé, intitulado “Estudando a bossa”:
“Diferentemente de mim, de Gil, de Gal e da torcida do Bahia, Tom Zé nunca foi um bossanovista. Comentado o ‘Estudando o samba’ com David Byrne em Nova Iorque, logo que saiu a primeira coletânea de Tom Zé que ele fez, eu disse: ‘Muito da força desse disco vem de Tom Zé não ser da área do samba: ele não é do Recôncavo, tem sotaque do sertão, não é meio carioca como o povo de Salvador’”.
E tome elogios ao disco e ao compositor.
Dois dias depois, Zé escreveu sua resposta. Fez questão de enfatizar que não leu o comentário de Caetano em seu blog (www.obraemprogresso.com.br), mas porque “foi parar no orkut”:
“Não, Caetano. Não posso aceitar. Agora estou irremediavelmente desertado e não posso mais voltar para o colo do grupo baiano. Você sabe que seus braços são preciosos e irresistíveis, mas não posso ir comemorar neles este disco, nem com você.”
Já tinha visto, lido e/ou ouvido em algum lugar, o velho Tom Zé explicitando seu ressentimento com o conterrâneo por este, supostamente, não o ter ajudado no longo e vasto pasto, onde e quando Tom Zé pastoreava tão somente a magreza das vacas.
Dessa vez o negócio ficou mais concreto, sem precisar das intervenções dos Irmãos Campos.
Zé elenca uma lista de uma dúzia ou mais nomes, quase todos nem assim tão conhecidos, aliás, segundo o próprio Tom, todos “nada”, diante da grandeza e influência do baiano mais famoso e com muito mais “prestígio”.
Mas foram aqueles que fizeram algo por Tom, que lhe deram ou emprestaram “proteção e alento”, ao contrário do mano Caetano.
AQUELE ABRAÇO
João Araújo, por exemplo, pai de Cazuza, mandava dinheiro escondido. Os jornalistas Alberto Villas e Arthur Nestrovski (que estará nesta Capital, no Ene, esta semana) o acudiram e ajudaram a publicar livro. Outros, encararam madrugadas em estúdios para gravar seus discos, único horário disponível aos sem-dinheiro. Walter Durst quase perdeu o emprego na Globo, porque impôs o cantor como “assistente de baianidade” numa mini-série.
Os bicos eram tão ou mais esdrúxulos do que esse, de “personal baianês”: compôs histórias infantis para a Editora Abril; cantou em casamentos de filhas de amigos; e quase não apenas cantou música caipira, como também, quase, usou “um turbante branco com uma pedra no centro” para virar um mago adivinho.
“Cada trabalho desses significava vários meses de supermercado, pois em casa, o trabalho de Neusa no Sesi muitas vezes era o que se tinha e estávamos conversados”, resumiu Tom Zé, elogiando a ajuda da esposa e comparando sua própria narrativa àquelas de Charles Dickens sobre os miseráveis londrinos.
Caetano, claro, não deixou barato. Veio de tréplica, também ele fazendo questão de dizer que não leu, lê, o blog de Tom Zé (tomze.blog.uol.com.br):
“Já que me mostraram aqui o que Tom Zé escreveu no blog dele, publico no meu a resposta que mandei pra ele. Tom Zé sempre foi maravilhoso a seu modo. Tom Zé, eu não sou o grupo baiano. Eu sou eu. E você não precisa recusar um abraço meu para ser grato a quem o ajudou”, etc etc. Caetano conclui, achando que Tom Zé está “jogando para a platéia”, que adora quando alguém o hostiliza.
E, desta vez, escreveu em horário mais caetano e menos joãogilbertiano: 10h50 da noite.
(O horário da resposta de Tom Zé? Ah, puro tomzé: 4h51, hora dos galos cantarem e desvairarem a Paulicéia, os gregos, os baianos.)
*
BOAS & MUITAS
Ex-deputado (do Ryo Grande), ex-prefeito (de Macaíba), ex-presidente (da Fundação Zé Augusto) e atualmente conselheiro do Tribunal (de Contas), Valério Mesquita lança hoje na livraria do Midway a segunda edição do seu “Poucas e boas”. Sete da noite.
PAY PER VIEW
Na linha do “é dando que se recebe” a assessoria do camarote Donna Donna (tipo assim, uma espécie de Château de Versailles do Carnatal) envia email aos jornalistas às margens do Putigy: “Por favor, enviem, se possível, o clipping de todas as notas publicadas sobre nosso camarote pois estaremos privilegiando, de forma justa, os colunistas que nos prestigiaram.”
Já sei que eu não vou.
SANTEIRO
“Cenas do cotidiano refletidas no imaginário de Xico Santeiro” é a exposição que abre hoje no Museu de Cultura Popular Djalma Maranhão, 18h.
Fica aberta até o final do ano, das 9h às 16h (com horário prolongado, até às 21h, durante os três dias do Ene).


PROSA
“Costumo dizer que, se dependesse de mim, Elvis Presley e Marilyn Monroe nunca se teriam tornado estrelas.”
Caetano
Verdade tropical
VERSO
“Todo compositor brasileiro é um complexado.”
Tom Zé
“Complexo de épico”

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